quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Da Consolação Noturna


A tarde inclinava sutilmente em direção à noite e os primeiros passageiros da penumbra ensaiavam sua dança onírica. O ar fresco ajudava. Um pensamento estendia a mão e da cartola escura trazia um novo rebento. Era dor, era calor, era tristeza, era paixão, era um pedaço sangrento de vida que teimava em não deixar a terra fria.
Quanto um pessoa aguenta antes do desespero- ela se perguntava- e quais os limites da angústia que uma alma pode suportar? A noite fria e silenciosa achou entre os espaços vazios o campo onde plantar suas sementes e tirar do invisível as mais estranhas feras que destroem suas vítimas com garras e pesadelos!
Enrubesceu. Porque nesses dias de falsidade é vergonha até mesmo pensar que se é humano, mesmo sozinho não nos deixam tirar as máscaras que o dia todo trazemos.
O céu estava limpo, e as estrelas, suas únicas confidentes, lançaram sua luz milenar sobre seu corpo sedento. Luz perdida, luz mortiça, luz que era a imagem perdida de milhares de anos atrás. Suas estrelas eram, como ela, fantasmas esquecidos.
Quanto de humilhação eu posso aguentar? E a pergunta ia morrer num soluço carente. Eu queria me esconder, queria encontrar abrigo, queria que não depender de remédios para dormir, queria ser má a ponto de pagar o ódio e a maldade que me votam com tal crueldade que que o próprio medo hesitaria em me olhar nos olhos!
Mas não era, toda ela era sofrimento porque no íntimo trazia uma alma boa. Boa e inocente, ainda que não perfeita. Queria ser diferente, queria vestir-se de negro e entre as sombras caçar suas vítimas.
Quanto uma pessoa suporta? Dizia. E a resposta se fez no silêncio, com o sussurrar mudo das folhas numa franca lamentação: Nada!
Como? Pergunta em delírios de confusão.Nada! Foi a resposta incompleta.
E ela "nada", porque em nada temos a obrigação de sofrer diante dos maus, pois o sofrimento é intangível como a luz da lua, uma mera ilusão do senso comum. "Não temos", dizia, e em seu peito entendeu que uma vez que sua mente estivesse guardada, nada poderiam os maus, nada, assim como nada puderam fazer contra aqueles que, embora na iminência da morte, eram já ha temos livres na alma.
Viver é isso- pensou - superar a si mesmo para superar todo o resto.
E a noite já não era tão escura, como não era tão mudo o silêncio!

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