As plantas ainda não cantavam quando o primeiro ente adentrou as matas. Naquele dia frio o farfalhar agitou as folhas tenras e no fundo do bosque a alma surgiu. Era bela como o luar e exibia com inocência suas formas nuas. No dia em que seus olhos se encontraram, as nuvens coroaram a terra com chuvas e as águas correram pelo solo ansioso. A tarde encontrou o manto suave da noite e a mata foi envolvida em seu abraço suave. No solo, os amantes sentiam o pulsar que a vida infligia à terra. Não havia palavras, apenas a canção sussurrada das folhas e o breve agitar das criaturas.
O tempo variou sobre as formas nuas. Os céus verteram águas até cessarem de vez. As árvores foram sendo engolidas pela terra seca até que tudo era rocha e solidão. O pó cobriu a vida e o canto deixou de ser ouvido.
Os dias e os anos passaram, um rio correu e a terra ao redor foi recobrando sua vitalidade. Num dia qualquer a primeira flor desabrochou e o solo desde então cobriu-se com a relva suave de uma terra nova e viva. Da suave progressão do tempo e da vida surgiu o som dos corações emaranhados dos amantes. Sob a lua nova seus corpos rolaram pela relva macia e os dias de amor iluminaram a orla do vale com luzes desconhecidas.
Os primeiros colonos chegaram quando a terra atingiu sua plena vitalidade. O solo sentiu os pés suaves das crianças e no fundo dos vales uma canção de alegria ecoou. Os dias passaram e a terra foi sulcada e cultivada e não se via mais aquela variedade do passado. O campo lá estava, mas monocórdio, frio e triste.
Os pés infantis sumiram e a terra era agredida pelo solado das botas. Havia estradas, e rochas que logo sucumbiram diante do asfalto. Os campos secaram e o rio deixou de correr. As casas dos colonos cresceram até quase chegar ao céu. A lua era raramente vista por entre as colunas de fumaça que se erguiam diante de um céu acinzentado.
O dia era negro e as pessoas andavam pelas ruas tropeçando umas nas outras. Aos poucos as vozes foram silenciando até que só havia o movimento do pó agitado pelo vento. A morte engoliu a cidade.
O tempo variou e os dias correram como gamos nascidos na primavera. Quando o homem não era nem mais uma lembrança, o céu se abriu e das fendas as primeiras chuvas vieram abraçar o solo ressecado e morto. As águas varreram a morte para a região do esquecimento e as sementes que jaziam no solo acordaram. As tardes cobriram as manhãs e se aninharam nos braços da noite. O céu foi ficando mais leve até que as estrelas encheram a noite.
Numa manhã qualquer a relva úmida da madrugada foi levemente acariciada pelos membros dos amantes que corriam felizes e o dia brilhava como se não tivesse havido um outro dia...
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