quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Conto: Colonização.


Vou quebrar o protocolo do Blog - a ideia era ser apenas de poesia- e apresentar um conto de ficção científica curto, na verdade uma ideia em gestação. A razão é que quero publicá-lo e não penso em criar mais um blog (já são três). Da sua forma esse conto tem muita poesia...

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Cem mil anos se foram.

Gaia, a imensa nave-mundo aproxima-se do planeta Bios, quarto a partir da estrela NXR-29 Beta Arantes. Lentamente Gaia toma seu lugar em órbita do planeta azul-esverdeado. As luas Giraz e Sinda 
são visíveis com seus tons esverdeados.

Há vinte e cinco anos as sondas-arautos habitam a crosta de Bios. Os engenheiros de Gaia conhecem cada detalhe da composição química da atmosfera, das rochas e das abundantes águas de Bios. Robos-geógrafos mapearam os três continentes, rovers vasculharam as áreas planas, drones sobrevoaram as imensas florestas verde azuladas habitadas por estranhas formas de vida que nunca descem ao solo e por criaturas quase reconhecíveis para seres humanos devido aos caprichos da convergência evolucionária. 

Bios é coberto por uma imensa floresta tropical, com áreas de savana e poucas regiões desertificadas. Semelhante à Terra, apenas um dos polos de Bios fica numa plataforma continental. 

Não foram encontrados sinais de processos de cognição e inteligência acima do Fator 5 da escala Poirot. Nenhuma criatura sapiens.

O imenso banco de dados de Gaia contem a informação genética de quase toda a vida da terra e de outros três mundos colonizados por humanos. Muitas das formas de vida descritas foram projetadas pelo homem e algumas centenas aguardam nos laboratórios de Gaia o momento de respirar o ar puro de Bios. Seres necessários à sobrevivência humana, mas cuidadosamente projetados para não desestabilizar muito o ecossistema local.

Nenhum humano a bordo de Gaia nasceu na Terra, todos eles são filhos do espaço, nascidos durante a Grande Peregrinação da raça humana em busca de novos mundos. Cada nova colônia, depois de estabelecida, começa a preparar a próxima nave-mundo que trilhará os abismos cósmicos.

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Cidades iluminadas se estendem sobre a crosta de Bios enquanto as duas luas fazem seu cruzeiro pelo céu noturno. Gaia aguarda a ordem de partir, nenhum humano anda pelos seus corredores imensos, todos eles descansam nos seus bancos de dados. O primeiro humano verá a luz dez anos depois de iniciada a viagem. Gerações se passarão antes que o próximo mundo habitável seja alcançado.

As palavras do Livro Sagrado soam nos alto-falantes da praça central de Úmbria, a capital de Bios. O Ancião-orador, sobre um tablado hexagonal, lê com lágrimas nos olhos as palavras do Profeta:

"Ouçam, Filhos do Homem, o apelo que a vida vos faz desde as profundezas cósmicas. Do brilho fugaz de uma estrela, um mundo vos chama. Deitai sobre o céu noturno e acordareis no Paraíso de um novo mundo. Ide e tomai por herança o Reino Celeste que vos implora a presença. Construí vossas arcas celestes, vossas Gaias, para viverdes muito tempo na solidão do berço. E logo que vosso pé marque a poeira de um novo mundo, preparai a próxima geração para continuar a vossa Peregrinação. Vosso destino está naquilo que vossas mentes não podem alcançar, onde vosso sonho se aninha nas tramas do Tudo. Não terminareis de trilhar todas as estrelas antes que vossos veneráveis ancestrais encontrem nas linhas do Universo sua morada final, nesse dia sereis um com o Todo. Ide, crescei e vos multipliqueis. O solo em que pisardes será sagrado para vós, mas não tanto quanto vossa missão. A mudança, meus filhos, é a mãe da sobrevivência. Mudai e se adaptai. Dos códigos de vida guardados em vossas arcas tirareis e acrescentareis novos tesouros. Não aportareis em terras de seres conscientes, mas, se possível, deixai para vossos irmãos algum dos dons que recebestes. Ide, cumpri vossa missão de levar Vida à matéria bruta, enquanto não sois um com ela".

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Cem mil anos se passaram e a imensa nave-mundo Gaia se aproxima de uma nova casa...

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