sábado, 12 de novembro de 2016

Quando comprei meus chinelos.



Quase todo mundo tem uma história marcante vivida na infância. Pode ser o dia em que aprendeu a andar de bicicleta, ou ganhou medalha no judô, tirou dez na prova de matemática, ou quem sabe ganhou aquele brinquedo que todos os amigos queriam. Eu também tenho a minha história , e ela aconteceu no dia em que comprei meu primeiro par de chinelos, as populares sandálias de borracha Havaianas.
Eu tinha, então, oito anos e as coisas andavam muito difíceis. Meus irmãos Cristiansara e Alex eram muito pequenos. Faltava tudo.
Naquela manhã o chinelo arrebentou de novo, e não havia mais prego que desse jeito. Minha mãe não tinha dinheiro para coisas mais urgentes, quem dirá meus chinelos.

Eu tinha que arrumar "algum". Na verdade eu já vendia sorvetes nas horas de folga, mas o que eu ganhava era sempre tão pouco...
Era um domingo. Saí de casa descalço e sem camisa, mas decidido. Fui até a sorveteria, apanhei a primeira caixa, e a segunda, e a terceira...
Andei pelas ruas apitando e trocando os pedaços de gelo levemente aromatizados pelas desejadas moedinhas.
No fim da tarde entreguei a caixa vazia. Assim que entreguei eles fecharam a sorveteria. Eu lembro de uma menina mais velha me atendendo e dizendo que eu fora o único sorveteiro daquele dia.
Eu não lembro o valor, nem o que eu senti. Mas não me esqueço da minha mãe me levando ao mercado. Esse mercado ficava onde hoje é o Supermercado Basso, perto da pedreira Paulo Leminski. Não sei se já era esse o nome.
Lembro claramente da minha mãe procurando meu número na prateleira, do pacote de plástico com fecho de barbante e dos chinelos. Chinelos dos mais simples, brancos em cima e azuis claros no solado e nas correias. Mas meus chinelos! Chinelos que me custaram um dia todo de trabalho, umas boas topadas nas pedras, cortes nas solas dos pés e uma experiência que me enche a memória de uma alegria ainda inexprimível trinta e quatro anos depois.
E ainda sobrou dinheiro para comprar alguma comida. 

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