sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Era novembro de 1989
















Era novembro de 1989 e as coisas estavam quentes por causa da campanha presidencial, a primeira com eleições diretas para presidente desde o fim do período militar. O clima era de esperança, parecia que o Brasil finalmente ia engrenar!
Lula e Collor disputavam as eleições. O pessoal, principalmente os mais pobres, estava deslumbrado pelo Collor.
O VANDERLEI falava comigo. Ele tinha visto um debate entre os candidatos, e ficara muito impressionado pelas respostas do Collor.
A cultura era, como é, pesadamente mediada pela televisão. Principalmente a Globo. Era óbvio que Collor era a opção da emissora. Ele encarnava perfeitamente o galã de telenovela, jovem, bem sucedido, esportista e inteligente. Ou assim fazia crer. Era era mais ou menos o Roque Santeiro (personagem de José Wilker na novela do mesmo nome) da vida real. E quem viveu aquela época sabe que o ator virou uma espécie de herói nacional, numa convergência da ficção com a realidade. Assim Collor foi recebido. E não era só o clima brasileiro, mas o mundo todo parecia efervescer. Naquele mesmo mês de novembro caiu o muro de Berlim.

Collor representava o novo mundo, a esperança. Era o Messias, como antes fora Tancredo Neves, mas atualizado para uma nova época, e com muito mais "charme". Aliás, como é forte esse negócio de messianismo na política! Anos depois até o Lula ia encarnar esse arquétipo, e com sucesso.

Mas eu estava tendo uma conversa com o Vanderlei. Ele fazia um panegírico (discurso elogioso) ao Collor, e eu ouvia deslumbrado. Ironicamente essa conversa se desenrolava num local bem pobre. Não havia água ou luz elétrica. A paisagem era bonita, um campo verde com alguns barracos e um rio ao fundo. Mas a pobreza era palpável. As pessoas que viviam nesses barracos haviam sido desalojadas de outro lugar.
Eu preciso falar do Vanderlei. Era meu amigo, dois anos mais velho. Ele tinha lá seus 16 anos. O pai tinha arrumado uma mulher mais jovem a deixara ao Vande a responsabilidade de cuidar da mãe e de dois irmão mais jovens. Ele trabalhava com construção, e não deixava faltar comida na mesa.
O Vande era um sucesso entre a gente. Na época os filmes de artes marciais faziam muito sucesso, e ele conseguia fazer uma abertura de pernas completa sobre duas cadeiras, igual ao Van Damme.
Mas era um garoto pobre, e com pouca educação formal que via no Collor o salvador do Brasil.
O tempo passou. Collor foi e voltou. A população, embora mais "educada", mudou muito pouco e messias ainda aparecem em toda nova eleição.
E eu não sei como anda o Vanderlei, hoje com seus 44 ou 45 anos. Será que ainda persegue seus messias? Ainda faz a abertura do Van Damme sobre duas cadeiras e acompanha extasiado os debates políticos?
Ou se tornou, como boa parte de nós, um telespectador desiludido que observa os tempos irem e virem, num eterno rodopiar de novidades que não passam de velharias repaginadas?
Vai saber.

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