domingo, 2 de fevereiro de 2014

Pássaros Negros

Mãe, essa noite sonhei com pássaros. Eles voavam ao meu redor e suas asas tocavam meu rosto, minhas costas. Eles faziam um barulho estranho mãe, eu não conseguia entender seu canto e mesmo assim eu sabia o que diziam em suas vozes quase humanas.

Eram negros, mas às vezes brancos e tão cheios de veneno que quase não me deixaram vivo.

Era noite, eu andava por um cemitério com cruzes por todos os lados. Parei em frente a um túmulo, era de uma moça, Mãe. Era quase uma criança mãe, tinha dezessete anos. Era uma foto antiga, ela morreu bem antes da senhora nascer. Vestia branco e tinha dois grandes olhos negros. Olhos assustados, mãe, como se ela soubesse o que viria.

Eu sabia que sob aquele olhar apenas ossos e pó me contemplavam...foi quando os pássaros vieram. 

E me tocaram como chamas, queimando e consumindo. Me fazendo arder com a dor da minha existência, efêmera insistência!

E sentir que cada sol era inútil, que os dias corriam como água de um rio morto. Eles gritavam em meus ouvidos que a vida era só um suspiro da morte. Que no fim as luzes se apagariam e a noite seria tudo.

Mãe, eu tentei me apegar aos meus pensamentos, meus dias, minhas realizações e vi nelas lama que engolia meus pés, minhas pernas...

Tão longe, mãe , os dias me pareciam e todos os que amei desvanecendo-se na distância e eu descia.

Eu gritava e nada me saía dos lábios, a lama me engolindo, e o dia tão inflexível encontrando seu ocaso. Os pássaro aninharam-se em árvores mortas e observavam quietos.

E os dias que não tive? As experiências que me faltaram? Os filhos que não vi crescerem? O amor que vou deixar?

Então a luz se foi, os pássaros sumiram e a lama evolou-se...era tudo vazio e silêncio. E um só pensamento me prendia "loucura".

Então acordei, mãe, suado, tremendo, com o coração pulando forte no peito. Um pouco de luz entrava pela janela e algo arranhava o vidro pelo lado de fora. Levantei-me e me apressei a abrir as cortinas. Então o terror me abraçou sem reverência lançando minha mente nas asas daquela loucura por um pouco apenas esquecida. Do lado de fora, olhando-me indiferente, havia um grande pássaro negro!

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