Mãe, essa noite sonhei com pássaros. Eles voavam ao meu redor
e suas asas tocavam meu rosto, minhas costas. Eles faziam um barulho estranho
mãe, eu não conseguia entender seu canto e mesmo assim eu sabia o que diziam em
suas vozes quase humanas.
Eram negros, mas às
vezes brancos e tão cheios de veneno que quase não me deixaram vivo.
Era noite, eu
andava por um cemitério com cruzes por todos os lados. Parei em frente a um túmulo, era de uma moça, Mãe. Era
quase uma criança mãe, tinha dezessete anos. Era uma foto antiga, ela morreu
bem antes da senhora nascer. Vestia branco e tinha dois grandes olhos negros.
Olhos assustados, mãe, como se ela soubesse o que viria.
Eu sabia que sob aquele olhar apenas ossos e pó me
contemplavam...foi quando os pássaros vieram.
E me tocaram como chamas, queimando e consumindo.
Me fazendo arder com a dor da minha existência, efêmera insistência!
E sentir que cada sol era inútil, que os dias
corriam como água de um rio morto. Eles gritavam em meus ouvidos que a vida era
só um suspiro da morte. Que no fim as luzes se apagariam e a noite seria tudo.
Mãe, eu tentei me apegar aos meus pensamentos, meus
dias, minhas realizações e vi nelas lama que engolia meus pés, minhas pernas...
Tão longe, mãe , os dias me pareciam e todos os que
amei desvanecendo-se na distância e eu descia.
Eu gritava e nada me saía dos lábios, a lama me
engolindo, e o dia tão inflexível encontrando seu ocaso. Os pássaro
aninharam-se em árvores mortas e observavam quietos.
E os dias que não tive? As experiências que me
faltaram? Os filhos que não vi crescerem? O amor que vou deixar?
Então a luz se foi, os pássaros sumiram e a lama
evolou-se...era tudo vazio e silêncio. E um só pensamento me prendia
"loucura".
Então acordei, mãe, suado, tremendo, com o coração
pulando forte no peito. Um pouco de luz entrava pela janela e algo arranhava o
vidro pelo lado de fora. Levantei-me e me apressei a abrir as cortinas. Então o
terror me abraçou sem reverência lançando minha mente nas asas daquela loucura
por um pouco apenas esquecida. Do lado de fora, olhando-me indiferente, havia
um grande pássaro negro!
Nenhum comentário:
Postar um comentário