sábado, 30 de março de 2013

O Livro e o desejo.


Abraçar um livro como quem abraça o amor da vida
E ouvir de perto os seus gemidos
Os gemidos delirantes do que sonhou seu ator
Um desses pérfidos escritores
Desses que tem essa mania de falar de ilusões
De querer que o humano que lê seja melhor
Mesmo narrando as mais absurdas barbaridades
Abraçar esse livro, mas abraçar com desejo
Como quem encontra o grande amor da vida
Nu sobre a cama depois de muitos anos...

Penetrar sem reservas na mente desse maluco e nesse transe
Ouvir falar o morto eternizado nessas palavras
Ler é falar com mortos, mesmo vivos
É entrar num túmulo onde imagens estão eternizadas
Mesmo que seu autor não passe de pó aos seus pés,

Mas é também preciso se entregar ao livro
Sem reservas de castidade
Acreditar piamente nas mentiras que ele conta
Mesmo quando elas são a mais pura expressão da verdade
É preciso ver com os olhos do morto, sentir seus desejos
E fingir com todo o descaramento que é ele
Quem fala e não as ilusões que vieram da gente.

Ler é fecundar um óvulo
É sempre metade da gente que se perde ali
Um tanto do feto é o escritor excretando
E boa parte são as safadezas perdidas na mente
Do, tão pérfido como o outro, leitor fascinado...

Por esses mundos falsos que fazem desse
Mundo ainda mais falso
Uma coisa que se torna um pouco mais suportável

Abraça um livro, com carinho, com desejo
Com toda a força que tem
Quem se entrega por inteiro!

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